O relógio do carcerário marca 1h30min da madrugada. Soa a campainha e a voz de um policial anuncia: “Mais um ‘hospede’!” – e apresenta um jovem algemado: “Artigo 33”. O carcereiro, acostumado à rotina, pensa: “Mais um traficante de drogas…”. Recolhe o rapaz, mas antes vai fazer a sua ficha. Pergunta seu nome, sua idade… 18 anos! – Responde meio amargurado, meio revoltado…
Preso pela primeira vez, o jovem vai ocupar o seu lugar em uma cela já abarrotada por muitos outros. Assustado, acomoda-se em um canto, mas mesmo depois do silêncio que se segue às recepções, não consegue dormir, apreensivo. O que se passa em seu interior? Talvez venha à sua lembrança dias melhores, quando ainda não era escravo de seus vícios, ou considerações sobre sonhos da juventude, roubados pela opção de uma vida sem Deus…
Logo chegam outros: “É 157!” – grita alguém. Todos sabem que é um assaltante à mão armada. Depois um homicida: 121… Um ano, dois anos, quinze anos de pena a cumprir!
O que leva alguém ao crime? Muitas causas. Porém, não poucas vezes, o vazio de uma vida sem valores, ou a busca irracional por ‘valores’ inconsistentes. Dizia Paul Claudel que “a juventude não foi feita para o prazer, mas sim para o heroísmo”. Sim! Nesse ‘vale de lágrimas’ nossa vida é uma luta. Não só aos jovens, mas a todos nós cabe optar entre uma vida de prazeres sem Deus, e uma vida de heroísmo.
A verdadeira liberdade, que é interior, não a teremos de ‘mãos beijadas’, nem na realização de nossos caprichos. Devemos conquistá-la! E isso significa muito mais do que estar fora das grades de uma prisão. Quantos há que, mesmo fora delas, tem seus corações encarcerados, presos a ambições, vaidades e egoísmos que os escravizam! Liberdade é sinônimo de heroísmo e não uma busca desenfreada de prazeres. E isso diz respeito não apenas às pessoas enquanto indivíduos, mas às famílias e às comunidades. Na exortação apostólica ‘Christifidelis Laici’ o saudoso Papa São João Paulo II, alertava que “é verdadeiramente grave o fenômeno atual do secularismo: não atinge apenas os indivíduos, mas, de certa forma, comunidades inteiras, como já observava o Concílio: ‘Multidões cada vez maiores praticamente se separam da religião” (30/12/1988).
Sirvam essas reflexões para nos mover a atitudes concretas que ajudem a conduzir para o rumo verdadeiro nossos irmãos ‘encarcerados’ – os de dentro, mas sobretudo os de fora das grades. E nos anime a pedir a Maria Santíssima- “que liberta dos grilhões os pecadores” – que conduza a humanidade sofredora à única e verdadeira liberdade, que nos foi conquistada por seu Divino Filho, Jesus Cristo, fora da qual tudo é ilusão (MT 6, 33).
(Artigo publicado originalmente na Revista Unidade da Diocese de São Carlos, e reeditada com adaptações)
Uma resposta
Ótimo artigo!
“É grandíssima esmola rogar pelos que estão em pecado mortal. Se víssemos um cristão amarrado a um poste, com as mãos atadas com uma forte cadeia, morto de fome, não por falta de alimento, pois tem junto de si finíssimos manjares, mas por os não poder chegar à boca, e, vítima, além disso, de fastio mortal, estivesse quase a expirar, não de morte como a deste Mundo, mas de morte eterna, não seria grande crueldade não lhe chegar a comida à boca?” O quarto de hora. Santo Enrique de Ossó