Paz sobre a terra, justiça e caridade!

Vivemos em uma sociedade em que cada vez mais o conceito de liberdade – e também o de felicidade – se funda na instabilidade: “Sou feliz porque sou livre, essa liberdade dá o direito de fazer o que eu quero”. Esse pensamento de fundo, que permeia quase tudo, também está presente no conceito de família, onde essa idéia é cada vez mais “vivida” na prática. Nada de família estável, fecunda, monogâmica e indissolúvel, concebida segundo os moldes cristãos, mas sim o “juntar” ou “ficar”, a união instável, que poderíamos chamar de “família experimental”. 

  Ora, isso vem acontecendo com cada vez mais freqüência, em razão desse novo e sempre antigo conceito equivocado de liberdade, subsumido na célebre frase dos estudantes parisienses de SORBONE: É proibido proibir”. No entanto, outro lema deveria servir de parâmetro ao homem moderno desejoso de obter a verdadeira liberdade: “Obedecer para ser livre”. Será este o tema deste artigo, ressaltado em epígrafe. 

  Segundo os ensinamentos pontifícios (cf. LEÃO XIII, Carta Encíclica Libertas Prastantissimum, 1888) liberdade é a faculdade consciente do homem de fazer ou deixar de fazer alguma coisa, por sua livre e espontânea vontade; a possibilidade de decidir livremente o que pensar, falar e agir. O homem não perde a liberdade de pensar: é impossível impedir que alguém pense. Só é possível limitar a liberdade de expressão do pensamento. 

  Na esteira desses pressupostos, conceitos de liberdade foram proclamados. Por exemplo, ser livre seria para alguns não sofrer coação física ou moral externa, a completa autonomia de um sujeito racional. Segundo esse conceito homem livre seria aquele que faz o que a vontade quer e que pode satisfazer seus desejos sem limitações nem obrigações. No caso do moderno conceito de família, o “ficar” ou o “juntar” seriam uma forma de família libertária, porque as vontades dos que se ligam são soberanas para desfazer num momento o que em outro fizeram. 

  Não obstante, todo homem é sujeito a limitações, porque as regras sociais e a própria lei natural impõe limites e obrigações. Estaria comprometida a liberdade, a faculdade de fazer o que se quer?

  Segundo o Papa Leão XIII, a vontade humana está sempre inclinada a querer o bem geral, a sua felicidade. Como encontrar esse bem, se possibilidades de escolha sobre o que nos convém são quase infinitas? A solução apontada pelo Sumo Pontífice está em que o anseio de liberdade não existe como um bem em si mesmo, mas como um meio para se atingir um bem maior e, entre a liberdade e o amor, deve sempre prevalecer este último bem. 

  Para melhor compreensão, podemos citar o exemplo do estudante que limita o seu tempo livre em que poderia, por exemplo, se divertir, para se dedicar ao objeto final do seu estudo, ou seja, concluir com êxito o seu mestrado ou doutorado; ou a mãe que sacrifica o seu repouso, por amor ao seu filho pequeno, quando lhe dispensa os necessários cuidados noturnos; ou ainda aquele que regula a sua liberdade e o prazer de comer bem, porque pretende perder peso. 

  Conforme Leão XIII, o anseio de liberdade que recusa o sacrifício, também teria seu fundamento no amor: amor de si mesmo, amor egoísta que escraviza o homem a ele próprio e tiraniza o outro, na medida em que quer impor sempre a própria vontade, numa “liberdade” sem parâmetros, sem limitações nem obrigações. 

  O amor ao bem disciplina a liberdade na busca daquilo que se deseja. Por exemplo, o aprendiz submete sua vontade livre à vontade do Mestre, porque deseja o bem maior que só por esse modo alcançará.

  O modelo de “família experimental” do “juntar” ou do “ficar”, assim como tantos outros modelos modernos, tributa a uma falsa liberdade o caminho da felicidade, porém, cada um ao escolher a si próprio como objeto único do seu amor, acaba tornando a vontade prisioneira dos próprios desejos e opressora em relação à liberdade do outro.

  Se nós queremos a verdadeira liberdade, não podemos aderir a esses modelos ‘libertários’ da sociedade moderna, pensando em família como uma justaposição de interesses egoísticos que duram enquanto convém. Isso não passa de uma forma velada de escravidão. 

  A doutrina cristã nos ensina a obedecer para ser livres. Neste sentido, concebe a família como um organismo sólido, fecundo, perene e indissolúvel, abençoado por Deus e dirigido ao seu fim sobrenatural, que é gerar filhos para a Santa Igreja e dar exemplo de santidade para os homens. Por estes meios, sem dúvida serão necessários sacrifícios e renúncias, mas que valem a pena em razão do fim supremamente maior a ser atingido, o reino de Deus e sua justiça nesta Terra, e a bem-aventurança na eternidade!


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